MORTES INACEITÁVEIS
O Brasil inteiro se sensibilizou com a
morte da menina de 8 anos de idade Ágatha Vitória Sales Félix, atingida por um
tiro de fuzil quando se encontrava com o avô, no interior de uma Kombi, em uma
comunidade no Rio de Janeiro, no último dia 20/09/2019. Segundo informações
iniciais, o disparo teria sido feito por policiais militares, que estariam em
diligência, em suposta busca de uma terceira pessoa.
A morte da criança Ágatha, caso se
confirme que o disparo veio dos militares, será a quinta ocorrida neste ano no
Rio de Janeiro, nas mesmas circunstâncias. E o pior: todos sabemos que não será
a última.
Passado o impacto provocado pela emoção
inicial advinda da notícia do assassinato de Ágatha, faz-se necessário pensar
também em outras notícias relacionadas a assassinatos vindas do Rio de Janeiro:
no espaço de uma única semana, de 16 a 22 de setembro de 2019, a Polícia
Militar do Estado do Rio de Janeiro perdeu nada menos do que quatro militares:
Ricardo Azevedo, Leandro Silva, Fellipe Pinheiro e Leonardo Santos, todos
baleados enquanto trabalhavam em defesa da sociedade.
Não se trata de desculpar nem
justificar o assassinato da menina Ágatha a partir do assassinato de quatro
policiais militares. Mas não se pode ignorar a estúpida pressão psicológica que
pesa sobre pessoas que trabalham em uma corporação - a PM RJ - onde já morreram
nada menos do que 45 policiais, do início deste ano até 22/09/2019. A pergunta
que a todos os momentos todos os que integram a PM RJ fazem a si próprios é:
qual de nós será o próximo? Porque haverá próximo.
A morte da menina Ághata é, sem dúvida,
mais impactante, pois se trata de uma criança inocente. Mas a dos pais de
família Ricardo, Leandro, Fellipe e Leonardo é igualmente inaceitável, mesmo
sendo eles adultos e profissionais de Segurança Pública que abraçaram uma
profissão de altíssimo risco.
Penso que o assassinato dos quatro PMs
e o da criança Ághata - assim como do total de 45 PMs e de cinco crianças
mortas desde o início de 2019 até o momento em que este texto é escrito -
mostra o tamanho da falência do Estado e da sociedade brasileira, o quanto
muita coisa está profundamente errada, apesar de cotidianamente fazermos de
conta que não, seja por conta do mais profundo egoismo; seja como mecanismo
psicológico de defesa que adotamos para continuarmos vivendo de forma
"normal" (assim mesmo, entre aspas).
Seria profundamente pretensioso apontar
aqui quais seriam as soluções para a situação acima. Entretanto, cabe clamar em
primeiro lugar pela valorização da vida: das crianças, dos policiais, e mesmo a
das pessoas que cometem crimes, que devem ser presas, processadas e cumprir
pena, mas não sumariamente assassinadas, exceto em situações extremas (reação
armada), que deveriam ser sempre uma exceção.
Cabe também defender o fortalecimento
do Estado brasileiro, não para matar indiscriminadamente, mas para que as
políticas de Educação, Inclusão Social, Desenvolvimento Humano e Segurança
Pública sejam de fato eficazes, pois não conheço nenhum exemplo de sociedade
que tenha superado a barbárie sem passar pela consolidação de um Estado que
esteja presente de fato e que seja radicalmente Democrático, respeitando
profundamente aos direitos de cada cidadão, seja rico ou pobre.
Tomara que a sociedade brasileira
encontre o caminho para superar o estado de barbárie dissimulada em que nos
encontramos. E que, até lá, nenhuma bala, perdida ou não, ceife a vida de
nossos filhos. Nem a nossa.
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